Há algum tempo, afirmei que não me considero mais “evangélico” e causei  espanto entre meus pares. Porém, cada dia que passa, quanto mais notícias ruins  sobem dos porões denominacionais, e quanto mais o Youtube mostra piadas sobre o  besteirol dos púlpitos, mais convencido fico de que nada tenho a ver com o que  foi meu berço religioso.  
Minha “auto-excomunhão” do movimento evangélico não é estética, embora eu  não tolere mais ouvir os cânticos de poesia rala e de música pobre que fazem  sucesso; não agüento mais hinos de guerra, convocando os crentes para pisar os  inimigos. Nem falo das  coreografias das danças. Horrorosas!
Minha “auto-excumunhão” do movimento evangélico não é ética, embora eu  tenha nojo do grande número de políticos que, em nome de Deus, exercem seus  mandatos com as mesmas práticas que os mais nefastos; não suporto mais conviver  com evangelistas e pastores, donos de um discurso radical quanto ao dogma, ao  credo, ao moralismo sexual, e que sabem papagaiar a Reta Doutrina, mas se  comportam como inescrupulosos manipuladores, sempre ávidos por dinheiro. 
Minha “auto-excomunhão” do movimento evangélico não é doutrinária. Eu  continuo crendo na Trindade; tenho a Jesus Cristo como Senhor e Salvador de  minha vida; falo em línguas estranhas desde minha experiência pentecostal; creio  e dou testemunho de milagres; oro por libertação de endemoninhados e aguardo  novos céus e nova terra. 
Minha “auto-excomunhão” do movimento evangélico aconteceu porque não posso  conviver com auto-proclamados “teólogos” que guardam suas doutrinas e conceitos  como verdadeiras vacas sagradas; não gosto do clima de caça às bruxas, que  apedreja e queima quem ousa mexer em “cláusulas pétreas”. 
Não tolero a intolerância, não aceito a exclusão, não me sinto bem com  discursos fundamentalistas. Acredito que toda interpretação é interpretação e  nada mais, e que ninguém – nem Santo Agostinho, nem Armínio e nem eu – tem a  última palavra quanto a verdade. 
Minha “auto-exclusão” do movimento evangélico aconteceu porque cansei de  ficar tentando ler a Bíblia com o literalismo fundamentalista. Acho fatigante  ter que, constantemente, fazer ginástica para explicar com a exegese própria dos  evangélicos, textos que discriminam as mulheres em Deuteronômio, ou aquele que  Deus manda um espírito de mentira para confundir os profetas. 
Não quero  mais fazer contas para explicar para os adolescentes como a arca de Noé pôde  abrigar todos os insetos, mamíferos, aves, répteis e batráquios do planeta.  
Minha “auto-exclusão” do movimento evangélico aconteceu porque não tenho  mais estômago para ficar ouvindo sermão do tipo: “Deus é poderoso, ele vai fazer  milagre”, e fechar meus olhos para os exilados de Darfur, ou para os miseráveis  que esperam nas filas dos ambulatórios imundos da baixada fluminense.  
Não quero viver a fé ensimesmada e privatizada que tanto se alastrou, e  que busca, ou convive, com o conceito burguês de mundo. Na verdade, não consigo  mais orar pedindo bênção, proteção, imunidade, prosperidade ou livramento. Não  quero ter que exercitar fé para “ver Deus abrir as janelas do céu”.
Minha “auto-exclusão” do mundo evangélico aconteceu porque tenho sede de  ser íntimo de Deus; porque, intuitivamente, percebo que a Bíblia possui uma  riqueza imensamente maior do que me ensinaram; quero viver na liberdade do  Espírito, sem medo das implicações e dos desdobramentos mais “perigosos” dessa  decisão.
Minha “auto-exclusão” do mundo evangélico aconteceu porque me apaixonei por  Deus de uma maneira que considero linda - mas que fica na contramão da maioria.  
Estou tão absolutamente cheio de curiosidade sobre dimensões da verdade  que, reconheço, jamais compreenderei completamente; estou com sede de ler como  nunca li, rir como nunca ri, dançar como nunca dancei; orar como nunca orei.  Quero glorificar a Deus com leveza, sem paranóias de que o diabo vai me pegar se  eu der brecha ou que serei punido com rigor se pisar na bola.
Minha “auto-exclusão” do mundo evangélico aconteceu porque hoje vejo  meu Próximo como amado de Deus e não mais como filho da ira; de repente, comecei  a perceber que a Graça foi espalhada sobre a terra assim como o sol, que  indiscriminadamente abençoa. 
Tento desvencilhar-me da linguagem excludente dos crentes. Já não tenho  medo de dizer que aprecio “música do mundo”, que considero os "Médicos Sem  Fronteiras" uma bela expressão do amor de Deus, e que  vou estudar, com enólogos, os mistérios dos melhores vinhos. Antes que me  esqueça, não acho que treinar para uma maratona seja perda de tempo. 
Não me definirei por nenhum movimento porque acho que os movimentos,  qualquer um, são cercas que empobrecem; não defenderei uma teologia específica,  nem a Relacional, porque não acredito que elas sejam suficientes para explicar o  Eterno – Gosto da frase de Paul Tillich: “Deus está para além de  Deus".
Para onde vou daqui pra frente? Anseio caminhar humildemente com  meu Senhor; vou tentar ser justo, desenvolver um coração misericordioso e amar a  paz.


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